Com quatro curtas exibidos gratuitamente, sendo três com cenas gravadas no município, mostra destaca a importância de descentralizar o audiovisual e valorizar narrativas amazônicas.
Na noite de domingo, 20 de julho, a comunidade do Ramal do Lago do Cacau, em Iranduba (AM), viveu uma experiência rara e especial: tornou-se sala de cinema sob as estrelas para a segunda edição do Cine Ykamiabas, mostra de filmes amazônicos organizada pela Ykamiabas Produções, das artistas e produtoras Francy Junior e Keylla Gomes.
A atividade, gratuita e aberta à comunidade, reuniu cerca de 30 convidados e moradores da região rural para assistir a uma seleção de curtas-metragens que expressam a potência criativa e a diversidade narrativa do audiovisual amazônico contemporâneo. Foram exibidos os filmes: DaSilva DaSelva, de Anderson Mendes; Solo Verde – Um Faroeste Caboclo, da produtora Branca3 Filmes; Fantasmas na Floresta, de Manoel Castro Júnior; e Jiupá, de Márcio Nascimento.
A mostra emocionou o público ao apresentar três obras com cenas gravadas no próprio município de Iranduba: DaSilva DaSelva, Jiupá e Solo Verde. Para a coordenadora Francy Junior, essa conexão com o território amplia o impacto do projeto:
“Trazer esses filmes para a comunidade rural é fortalecer a identidade local. Quando as pessoas se reconhecem na tela, nos rostos, na paisagem, nas falas, a arte se torna espelho e instrumento de pertencimento. É sobre ocupar o nosso próprio imaginário, com nossas histórias e memórias.”
Já a produtora e artista Keylla Gomes reforça o papel da mostra como ação de resistência e democratização cultural:
“O Cine Ykamiabas nasce de uma urgência: descentralizar o acesso à cultura e fazer com que a arte chegue onde ela quase nunca chega. Levar o cinema para o ramal, de forma gratuita, com afeto, com troca, com pipoca e refrigerante, é também dizer que esses lugares merecem tudo. Inclusive o melhor do nosso cinema.”
Os filmes exibidos abordam diferentes camadas do imaginário amazônico:
DaSilva DaSelva mergulha na vida e na arte do visionário artista amazonense Da Silva da Selva, oferecendo uma travessia poética por sua memória visual e sensível. Um documentário-experiência que mistura arte, espiritualidade e resistência.
Solo Verde – Um Faroeste Caboclo mistura realismo mágico, cultura popular e suspense em um conto amazônico sobre maldição, violência e laços familiares, numa estética singular que revisita o gênero faroeste sob o olhar da floresta.
Fantasmas na Floresta é um drama psicológico com tintas de terror, onde a dor da perda se encontra com o sobrenatural em plena selva, em uma narrativa que questiona os limites da realidade e da sanidade.
Jiupá é uma fábula amazônica que evoca mitologias, silêncios e ancestralidade, reforçando a potência dos saberes tradicionais e da escuta das florestas.
Além da exibição dos curtas, a noite contou com distribuição de pipoca e refrigerante para os presentes — gesto simples que reforça o cuidado e o carinho da equipe com a experiência coletiva do cinema.
Após o sucesso da mostra, a Ykamiabas Produções já prepara seu próximo projeto: a oficina “Pathos – Teatro pelo Clima”, voltada à juventude da zona norte de Manaus. As inscrições, totalmente gratuitas, serão abertas em breve.
O Cine Ykamiabas reafirma a importância de iniciativas independentes que pensam o cinema como ferramenta de diálogo, inclusão e transformação, levando arte de qualidade a lugares onde o acesso ainda é exceção — e não regra. Em tempos em que a floresta, os saberes e os povos amazônicos seguem em disputa, mostrar e fazer cinema torna-se também um ato político de resistência e amor.
