A Justiça do Trabalho reconheceu o vínculo de trabalho de uma empregada doméstica que foi mantida em situação análoga à escravidão por mais de 70 anos. Os empregadores, mãe e filho, terão que pagar à vítima uma indenização por danos morais individuais no valor de R$ 600 mil, além das verbas trabalhistas de todo o período trabalhado.
Para a procuradora do trabalho responsável pelo processo judicial, Juliane Mombelli, esse caso representa um paradigma importante para o combate ao trabalho escravo no país. “O reconhecimento da relação de trabalho em condições análogas à escravidão de pessoa que foi forçada a prestar serviços desde a infância, acolhendo as provas produzidas no Inquérito Civil do MPT, demonstra um amadurecimento do judiciário brasileiro no enfrentamento de situações de grave violação aos direitos humanos”, citou a procuradora.
A idosa foi resgatada em 2022. A vítima, à época com 85 anos, trabalhou desde os 12 anos em situação de exploração, por três gerações da mesma família, sem que qualquer direito fosse concedido. A investigação do Ministério Público do Trabalho do Rio de Janeiro identificou que o empregador tinha os documentos pessoais da trabalhadora e realizava os saques da aposentadoria dela.
O juiz Leonardo Campos Mutti, da 30ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, destacou que a vítima “trabalhou ao longo de praticamente toda a vida com dedicação exclusiva e integral aos réus, em prejuízo da própria vida e do pleno desenvolvimento como pessoa, sem receber salário ou qualquer outro direito trabalhista, sem liberdade, submetida a condições degradantes de trabalho e a todo tipo de restrição, sendo privada até mesmo de ter a plena consciência de que era vítima de grave ilicitude praticada pelos réus”.
O que é trabalho análogo ao escravo?
Segundo o Código Penal brasileiro, trabalho análogo ao escravo é aquele em que o trabalhador é submetido a qualquer uma das seguintes condições: trabalhos forçados, jornadas exaustivas, condições degradantes de trabalho e restrição de locomoção por conta de dívida contraída com o empregador.
Situações em que o empregador proíbe o trabalhador de usar qualquer meio de transporte ou toma posse dos documentos ou objetos pessoais do funcionário com o intuito de retê-lo no local de trabalho são exemplos de restrição de locomoção.
“Além disso, as jornadas de trabalho sem os intervalos legais e intensas ao ponto de causarem danos físicos, a falta de banheiros ou banheiros precários, a existência de alojamentos sem higiene e a oferta de comida inapropriada (ou a falta de comida) para consumo também podem caracterizar situação de trabalho análoga à escravidão”, destaca o Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região.
Correio Brasiliense