A Polícia Federal deflagrou na manhã desta sexta-feira (18/7) uma operação que tem como um dos alvos o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Por determinação do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), foram cumpridos dois mandados de busca e apreensão, além de medidas cautelares contra o ex-presidente.
Entre as determinações impostas pelo STF, estão o uso de tornozeleira eletrônica, o veto ao uso de redes sociais e a proibição de Bolsonaro sair de casa entre 19h e 6h e durante os fins de semana.
Moraes também proibiu o ex-presidente de se comunicar com “demais réus e investigados” em inquéritos no STF, o que inclui o seu filho Eduardo Bolsonaro, deputado licenciado que se mudou para os Estados Unidos com o intuito de pressionar o governo americano a tomar medidas contra Moraes e que levem à anistia dos envolvidos nos atos de 8 de janeiro, em Brasília.
Além disso, Bolsonaro está proibido de manter contato com diplomatas ou embaixadores, frequentar embaixadas ou se comunicar com outros réus e investigados pelo Supremo.
Na decisão desta sexta, Moraes afirma que as investigações indicam que Bolsonaro estaria atuando de forma deliberada e ilícita, em conjunto com seu filho Eduardo, para obter a imposição de sanções contra agentes públicos brasileiros.
O objetivo, ainda segundo a decisão, seria tentar submeter o funcionamento do STF “ao crivo de um Estado estrangeiro, por meio de atos hostis e negociações criminosas” com a finalidade de coagir a Corte.
O trecho é uma referência à carta em que o presidente dos EUA, Donald Trump, cita a decisão de impor uma tarifa de 50% sobre produtos brasileiros como uma reação, entre outras coisas, ao tratamento “injusto” dado ao ex-presidente.
Em declaração a jornalistas em Brasília após colocar a tornozeleira eletrônica, Bolsonaro disse que o objetivo da operação desta sexta é a sua “suprema humilhação”.
“Eu nunca pensei em sair do Brasil, nunca pensei em ir para embaixada, mas as cautelares são em função disso”, disse Bolsonaro.
Em fevereiro, o ex-presidente passou dois dias na embaixada da Hungria, em Brasília.
Na operação desta sexta, foram apreendidos cerca de US$ 14 mil, segundo Bolsonaro, além de um pen drive que o ex-presidente disse “não ter ideia” do que se tratava. O celular de Bolsonaro também foi recolhido pelos agentes, segundo o jornal Folha de S.Paulo.
Em nota, a defesa de Bolsonaro fala em “surpresa e indignação” com a decisão do Supremo. E argumenta que o ex-presidente “sempre cumpriu as determinações” do tribunal.
“A defesa do ex-Presidente Jair Bolsonaro recebeu com surpresa e indignação a imposição de medidas cautelares severas contra ele, que até o presente momento sempre cumpriu com todas as determinações do Poder Judiciário. A defesa irá se manifestar oportunamente, após conhecer a decisão judicial.”
O partido do ex-presidente, o PL, disse que “considera a medida determinada pelo Supremo Tribunal Federal desproporcional, sobretudo pela ausência de qualquer resistência ou negativa por parte do presidente Bolsonaro em colaborar com todos os órgãos de investigação”.
Nas redes sociais, Eduardo Bolsonaro citou Donald Trump e declarou que com as novas medidas Moraes “dobrou a aposta”.
Em sessão virtual extraordinária convocada para começar ainda nesta sexta, a Primeira Turma do STF se reúne para julgar as medidas cautelares determinadas por Moraes contra Bolsonaro.
O ministro Flavio Dino já declarou seu voto e referendou todas as medidas cautelares contra Bolsonaro. Além de Dino e Moraes, fazem parte da Primeira Turma os ministros Cristiano Zanin, Cármen Lúcia e Luiz Fux.
O que levou Moraes a autorizar tornozeleira em Bolsonaro
Em sua decisão, Moraes apontou que haveria indícios de que Bolsonaro estaria praticando ao menos três crimes: coação no curso de processo legal; obstrução de investigação; e atentado à soberania.
Moraes avalia que Jair Bolsonaro e Eduardo Bolsonaro estariam conduzindo “negociações espúrias” com autoridades dos Estados Unidos para pressionar o STF contra o andamento do julgamento sobre tentativa de golpe de Estado do qual o ex-presidente é réu.
No documento, Moraes diz que as ações de Bolsonaro e Eduardo junto aos EUA acontecem “por meio de atos hostis derivados de negociações espúrias e criminosas com patente obstrução à Justiça” e teriam a “clara finalidade de coagir essa Corte no julgamento da AP 2.668/DF”
AP 2.668/DF é a sigla para a ação penal 2.688 que tramita no STF referente à suposta tentativa de golpe de Estado entre 2022 e 2023 na qual, segundo a Procuradoria Geral da República (PGR), Bolsonaro seria o líder. Bolsonaro, por sua vez, nega sua participação na trama.
Em sua decisão, o ministro também vincula o auxílio financeiro que Bolsonaro deu ao filho, estimado pelo próprio ex-presidente em US$ 2 milhões, às ações do deputado federal licenciado em favor de sanções contra autoridades e contra o país.
“Ressalte-se, ainda, que a investigação comprovou a participação de Jair Messias Bolsonaro nas condutas criminosas, não só incitando a ‘tentativa de submeter o funcionamento do Supremo Tribunal Federal ao crivo de outro Estado, com clara fronta à soberania nacional’, mas também auxiliando, inclusive com aportes financeiros à Eduardo Nantes Bolsonaro, a negociação com governo estrangeiro para que este pratique atos hostis contra o Brasil”, diz um trecho do documento.
Moraes também mencionou em sua decisão que a PGR citou a possibilidade de uma eventual fuga de Bolsonaro para justificar o uso de tornozeleira eletrônica e o monitoramento do acesso de Bolsonaro a representações diplomáticas.
Ao justificar o pedido das medidas cautelares, Moraes diz que os fatos recentemente identificados são “indicativos da concreta possibilidade de fuga do réu e a manutenção de ações para obstruir o curso da ação penal”.
Crise com Trump
As novas medidas contra Bolsonaro determinadas por Alexandre de Moraes, do STF, ocorrem após o presidente dos Estados Unidos anunciar tarifas de 50% sobre todos os produtos brasileiros, usando como um dos argumentos o fato de o ex-presidente brasileiro estar sendo alvo de processo no Supremo.
Na quinta (17/07), Trump enviou uma carta a Bolsonaro com críticas duras ao sistema de Justiça brasileiro.
“Eu vi o terrível tratamento que você está recebendo nas mãos de um sistema injusto voltado contra você. Este julgamento deve terminar imediatamente!”, escreveu Trump.
“Não estou surpreso em vê-lo liderando nas pesquisas; você foi um líder altamente respeitado e forte que serviu bem ao seu país.” As pesquisas mais recentes, no entanto, mostram que é Lula quem lidera as pesquisas.
Antes, no dia 9 de julho, Trump publicou uma carta endereçada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciando que as exportações brasileiras sofrerão uma taxação adicional de 50% a partir do dia 1º de agosto.
Em tom duro, a carta diz que a decisão é uma resposta à perseguição que Bolsonaro estaria sofrendo no Brasil, devido ao processo criminal que enfrenta no Supremo, acusado de liderar uma tentativa de golpe de Estado.
Além disso, Trump também justificou o aumento de tarifa argumentando que o Brasil adota barreiras comerciais (tarifárias e não tarifárias) elevadas contra os EUA, o que estaria desequilibrando o comércio entre os dois países.
O governo brasileiro refuta essa argumentação, já que a balança comercial tem sido favorável aos Estados Unidos. O lado americano acumulou saldo positivo de US$ 43 bilhões nos últimos dez anos, segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços.
BBC NEWS BRASIL